O caso Visanet
13/5/2013 17:51
A história de uma farsa – Capítulo 2
Um petista no lugar certo, na hora certa
Por Miguel do Rosário, no Blog O Cafezinho.
Trazer o questionamento sobre a lisura no julgamento do mensalão para
esta grande ágora pública, a internet, nos permite provocar um debate
instantâneo, que nos ajuda a desenvolver nosso trabalho. Os dois
primeiros textos já publicados geraram algumas reações negativas
curiosas. Um internauta fez uma declaração emocionante: “O PT me fez
desacreditar na política, e agora quer me fazer também descrer na
Justiça”. Outro se pergunta, perplexo, como pode ser que alguém “não
entender que partido político e seus governos, no Brasil, não passam de
quadrilhas que vivem meramente de dinheiro
público? Assim, o Executivo é o poder que estrutura a corrupção no
Brasil. Resta ao Judiciário moralizar e colocar a política em seus
trilhos”.
Sem se dar conta, essas críticas apenas reforçam a argumentação
central que procurarei expor aqui: a acusação usou e abusou de uma
lógica de “linchamento”, que serviu para desqualificar o processo
político e as entranhas da nossa jovem democracia. E tudo em prol de
soluções de força a serem tomadas pelo ministério público e pelo
judiciário, tidos aqui na conta de instâncias “não políticas”. Só que
não é verdade. Onde existe poder, existe política. É claro que existe
política no Ministério Público e no Judiciário, só que de maneira mais
obscura do que nas esferas do Estado vinculadas ao sufrágio.
Como nasce um linchamento político? Pega-se uma comunidade revoltada
com séculos de corrupção, aponta-se-lhe um culpado, de preferência uma
figura pública. Que graça tem pegar um promotor corrupto ou um juiz
incompetente. Como não votamos, não nos sentimos culpados por seus
crimes. Já um político corrupto gera um sentimento de culpa coletiva.
Como fomos idiotas em votar nesse calhorda! Daí para a catarse do
linchamento, é o passo seguinte.
Não vamos negar que existam políticos corruptos aos borbotões. E a
missão republicana do Ministério Público, do Judiciário, da Polícia
Federal, e das próprias institiuições políticas, é combatê-los. O que
fazer, contudo, quando os próprios corruptos, numa jogada brilhante,
assumem a responsabilidade pelo combate à corrupção e, ao invés de pegar
os verdadeiros vilões, miram apenas em seus adversários políticos; e,
no lugar de uma investigação séria, se aliam aos meios de comunicação
para encetarem inquéritos fajutos, sensacionalistas e tendenciosos?
Pois é, meu inocente amigo, se queres fazer alguma coisa concreta
para combater a corrupção no Brasil, terás que se desvencilhar de toda
ingenuidade. Existe luta de poder, política e corrupção em todas as
instituições da República, incluindo MP e Judiciário. Não digo isso para
sufocar a esperança do cidadão comum numa solução ética para o problema
político brasileiro. Claro que há! Mas certamente não é linchando
inocentes, nem manipulando inquéritos. A busca pela ética na política
passa também pela exigência de investigações rigorosas e imparciais, e
julgamentos justos, além do fortalecimento da consciência crítica do
cidadão, que precisa estar devidamente vacinado contra a demagogia de
setores corruptos do MP e do judiciário.
Temos que pegar os corruptos, mas temos que pegar também os corruptos
que simulam e manipulam investigações para desviarem a atenção da
opinião pública.
E aí voltamos para o caso Visanet e para o indiciamento de Henrique
Pizzolato. Todos os laudos, auditorias e documentos à disposição do
procurador geral da República, Antônio Fernando de Souza, e do relator
da ação junto ao STF, Joaquim Barbosa, provavam a inocência de Pizzolato
e, no entanto, ele foi indiciado e depois condenado. Por quê?
Bem, o porque requer uma resposta mais complexa, porque trata de
interesses políticos, e vamos discuti-la mais adiante. Por enquanto,
podemos discutir outra questão: como? Como a procuradoria e o STF
conseguiram a proeza de indiciar e condenar um inocente, à revelia de
tantos documentos que provavam o contrário?
Para isso, há uma resposta dura e direta: omissão e má-fé. Quando
apareceu o nome da Visanet na CPI e no noticiário, o Ministério Público
mandou a Polícia Federal investigar quem eram os responsáveis, dentro do
Banco do Brasil, pela relação com a Visanet, sobretudo quem
fiscalizava, no BB, as campanhas patrocinadas pelo Fundo de Publicidade
da Visanet, nos anos de 2001 a 2005. A investigação foi rápida e
fácil. A parceria entre Banco do Brasil e Visanet data de 1999. A
partir de 2001, a Visanet cria um fundo de publicidade, alimentado por
seus bancos parceiros. Esse fundo continuava sendo propriedade da
Visanet, conforme provam todas as auditorias já realizadas. Mas os
parceiros tinham direito de orientar campanhas, escolher as agências que
as fariam e propor o pagamento das mesmas. Executivos do Banco do
Brasil integravam o Conselho de Administração da Visanet, e havia um
funcionário do BB com a função de “gestor” do Fundo de Publicidade
Visanet.
O nome de Pizzolato sequer aparece no laudo 2828, que reúne as
informações coletadas pela Polícia Federal a pedido do Ministério
Publico, sobre a relação da Visanet com o Banco do Brasil. Por uma razão
simples: como diretor de marketing do BB, Pizzolato não tinha nenhum
controle sobre o fundo da Visanet, cuja relação com o BB se dava através
da diretoria de Varejo (que lida com cartões de crédito). Pizzolato
nunca foi gestor do fundo Visanet. A investigação descobrira ainda que a
Visanet mantinha relações com a DNA Propaganda ao menos desde 2001.
Todos os funcionários do BB que mantinham relações com a Visanet
(funcionários do BB que integravam o conselho de administração da
Visanet, gestores do fundo Visanet, diretores de Varejo, vice-presidente
de Varejo, e o próprio presidente do banco) eram remanescentes da era
tucana. Todos haviam chegado aos respectivos postos através de nomeações
feitas antes da eleição de Lula, e todos se alinhavam ideologicamente
ao PSDB.
Entretanto, o laudo2828, mesmo contendo informações vitais à defesa e
à compreensão do processo, foi mantido em sigilo para os advogados de
Pizzolato e para a opinião pública. O documento foi varrido para debaixo
dos espessos tapetes da procuradoria e do STF. Quando a denúncia da
Procuradoria foi encaminhada ao STF e começou a ser debatida pelos
ministros, o laudo 2828 jamais foi mencionado. O relator da Ação,
Joaquim Barbosa, ao arrepio das informações contidas num documento que
ele mesmo havia deferido, declara em seu voto:
“Assim, Henrique Pizzolato agiu com o dolo de beneficiar a agência representada por Marcos Valério, que não havia prestado qualquer serviço em prol dos cartões do Banco do Brasil de bandeira Visa, tampouco tinha respaldo contratual para fazê-lo. De fato o contrato entre a DNA Propaganda e o Banco do Brasil não fazia qualquer alusão à Visanet. “
O voto de Barbosa merece um prêmio: conseguiu reunir num pequeno
trecho uma quantidade tão grande de inverdades que pode arrumar um
emprego fácil como editorialista do jornal O Globo:
1 – Pizzolato não poderia ter agido “com dolo de beneficiar Marcos
Valério” porque nunca teve o poder de propor pagamentos para a DNA
Propaganda. Essa função era do gestor apontado pela diretoria de Varejo;
na época de que trata a acusação, esse gestor era Léo Batista dos
Santos.
2 – A DNA Propaganda prestou, sim, serviços ”em prol dos cartões do
Banco do Brasil de bandeira Visa”, e tinha total respaldo contratual
para fazê-l0, desde 2001.
3 – Havia diversos pareceres à disposição de Barbosa comprovando a relação entre a DNA, BB e Visanet.
Continue a ler por aqui.
***
Leia também:
Prefácio: Mensalão, a história de uma farsa.
Capítulo 1: Acusações contra Pizzolato lembram Dreyfus e Kafka.
leia mais no link
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