sexta-feira, 1 de outubro de 2010

sexta-feira, 1 de outubro de 2010 “Eu vou morrer sonhando que eu não deveria morrer” outubro 1st, 2010 | Autor: Urariano Mota




Trechos da entrevista do Presidente Lula ao site Carta Maior e aos jornais La Jornada, do México, e Página/12, da Argentina.


“Na Presidência primeiro a gente aprende a governar. Quando você chega à Presidência da República, você se depara com a tua convivência de muitos anos de oposição em que você vai para um debate, você vai para uma reunião e você diz aos teus interlocutores “eu penso, eu acho, eu acredito”. Quando você está no governo, você não pensa, você não acha e você não acredita; você faz ou não faz. E o governo é um eterno tomar de posição. Você aprende a ter mais tolerância e você aprende a consolidar a tua prática democrática, porque a convivência política na adversidade é um ensinamento estupendo para quem acredita na democracia como um valor incomensurável na arte de fazer política. E isso a gente só aprende exercitando todo santo dia. Eu não acredito que tenha uma universidade capaz de ensinar alguém a fazer política, a tomar decisão. Você pode teorizar, mas entre a teoria e a prática tem uma diferença enorme no dia a dia. E eu penso que esse é o aprendizado….

No dia em que a imprensa brasileira resolver divulgar a revolução que aconteceu no Brasil, o povo vai se dar conta por que é que o governo aparece com 80% de aprovação nas pesquisas. Não é o Lula, é o governo que aparece com 80% de aprovação no oitavo ano de mandato. Qual é o fenômeno? Porque não depende da imprensa. Se dependesse da imprensa, eu teria 10, menos 10 de aprovação. Eu estaria devendo pontos. Ou seja, qual é o fenômeno? O fenômeno é que as coisas estão chegando na mão do povo. O povo está recebendo os benefícios, o povo está vendo as coisas acontecerem. E quem não falou não fez parte da história nesse período. Eu acho que essa foi a grande mudança que eu vejo de 2003 para 2010.

Eu vou terminar o meu mandato sem nunca ter almoçado com nenhum dono de jornal, nenhum dono de televisão, nenhum dono de revista, durante o meu mandato. Mantive com eles uma relação democrática, respeitosa, entendendo o papel deles e querendo que eles entendessem o meu papel. Acho que muitas vezes o povo sabe das coisas boas que acontecem neste país porque nós divulgamos, em publicidade do governo, porque a internet divulga, os blogs divulgam, o blog do Planalto divulga….Mas às vezes, se dependesse de determinados meios de comunicação, eles simplesmente não falam a respeito do assunto. Alguns até dizem “olha, nós não temos interesse em fazer essa cobertura oficial, de inauguração de coisa”…

Nós levamos algum tempo para que a parcela mais pobre da população, os trabalhadores organizados, começassem a ver, no exercício da Presidência, alguém deles. Hoje, milhões de brasileiros quando me veem, eles me veem com um deles que chegou lá, e isso deu mais credibilidade e dá mais possibilidade de a gente fazer mais coisas, e também mais irritação aos nossos adversários. Como os nossos adversários estão fragilizados nos seus partidos, utilizam de alguns meios de comunicação para fazer a grande oposição ao governo, e nós, ao invés de ficarmos nervosos, temos que ficar felizes, porque isso faz parte do processo democrático.

“Acabou o tempo em que a “casa grande” dizia o que a “senzala” tinha que fazer, acabou“.

Eu digo sempre, acho que é importante dizer isso agora e não esperar outro momento, para dizer. Eu digo sempre que eu, às vezes, tenho a impressão de que tinha gente que tentava me provocar para que eu tentasse tomar uma atitude mais ríspida contra qualquer meio de comunicação, que eu tentasse fazer intervenção… E quanto mais eles me batiam, mais democracia; e quanto mais batiam, mais liberdade de expressão, até todo mundo perceber que só tem um juiz: é o leitor, o telespectador e o ouvinte. São eles que nos julgam. Ele só vai ler o que ele quiser ler e sabe interpretar, só vai assistir àquilo que assistir e sabe interpretar, e ele não quer mais intermediário, ele não quer mais o tal do formador de opinião pública. O cidadão coloca uma gravata, vai à televisão, dá uma entrevista e se autodenomina formador de opinião pública e acha que todo mundo vai segui-lo. Aí, você tem o presidente de uma Central Única, aqui no Brasil, que representa milhões de trabalhadores, esse não é formador. Então, essas coisas foram caindo por terra. O povo brasileiro não quer intermediário. Ele quer falar pela sua boca, enxergar pelos seus olhos e tomar decisões pela sua consciência. Acabou o tempo em que a “casa grande” dizia o que a “senzala” tinha que fazer, acabou.

Quando eu chego à Presidência, pensaram duas coisas: “Bom, vamos respeitar a democracia e vamos deixar o operário chegar lá”. O operário chegou, e eles torciam, acreditavam piamente que eu iria ser um fracasso total e absoluto, e que a esquerda e seu operário metalúrgico iriam sucumbir na incapacidade de governar o país. Era esse o pensamento. O que aconteceu? O operário deu certo e começou a fazer mais do que eles, e aí eles se quedaram nerviosos.

Daí porque eu acho importante a revolução da internet, que muita gente ainda não compreende ou não quer compreender. Mas, hoje, tudo depois da internet está velho, tudo. Está tudo velho, porque a internet é tempo real, ou seja, eu acabo de dar uma entrevista coletiva, eu venho à minha sala, em 30 segundos, eu ligo lá, já estão todas as notícias no mundo inteiro. Não sei como é que o mundo vai sobreviver a essa avalanche de possibilidade de informações que a sociedade tem. As pessoas interagem, as pessoas interagem, as pessoas respondem, as pessoas criticam, as pessoas se sentem co-feitoras da notícia, então eu acho isso extraordinário.

Eu acho uma vergonha aquele muro do México e dos Estados Unidos. Acho uma vergonha, depois de toda a glorificação da derrubada do Muro de Berlim, a gente ter o muro do México e o muro de Israel. Acho muito feio para a humanidade. Eu acho que o único muro que nós deveríamos assimilar era a Muralha da China, que virou uma coisa turística. Os demais são muros segregadores, e ninguém fala nada, ninguém fala nada. Você não vê fotografia do muro separando o México dos Estados Unidos, nos meios de comunicação.

Considerando essa posição, o senhor acredita que continua sendo um homem de esquerda?

Eu me considero um homem de esquerda, e os resultados das políticas que nós fizemos são tudo o que a esquerda sonhava que fosse feito. Você veja uma coisa: é um pouco um paradoxo que eu seja o único Presidente que este país teve que não tem diploma universitário e sou o Presidente que mais fez universidade, e sou o Presidente que mais coloquei jovens na universidade e que mais fez escolas técnicas. Fomos os que mais geramos empregos, os que mais combatemos a pobreza, os que mais exercitamos os direitos humanos e os que mais fortalecemos a democracia.

Eu estou convencido de que Dilma vai ser eleita presidente, mas como eu sou um democrata, eu tenho que falar… eu estou dando a entrevista na quinta-feira e a eleição será no domingo – faltam dois dias e meio –, eu sou obrigado a só poder ser contundente mesmo depois da eleição.

Eu sonho em contribuir para o desenvolvimento da África, eu sonho em ajudar a América do Sul e a América Latina a serem mais fortes, a serem mais ricas, a se desenvolverem mais rapidamente, ou seja, eu vou morrer sonhando que eu não deveria morrer. É assim…

Eu já estou com 65 anos de idade. Estatisticamente, eu posso ter mais dez ou quinze anos de vida, eu acredito em estatística. Eu sei que, quando a gente completa 60 anos, cada ano, a partir dali, vale por dez. Então, eu tenho noção de tempo e eu tenho noção de que me resta menos de um quarto do tempo que eu já tive – ou um quinto – para fazer coisas que eu acredito que possam ser feitas”.

(Copiado do Carta Maior, http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=17007)

Iniciamos as postagens de outubro, com esta entrevista do Presidente Lula, publicada no Blog da Dilma

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